quarta-feira, 27 de julho de 2011

Entrevista Marcelo Barbosa (Julho 2011)



Marcelo Barbosa (Khallice, Zero 10, Almah) é um verdadeiro prodígio na guitarra, iniciando cedo seu amor pela guitarra e dedicação aos estudos do instrumento, Marcelo se tornou uma das principais referências quando o assunto é guitarra no Brasil.


Virtuoso e liberto para percorrer diversos estilos e tons é com ele que conversaremos nestas vastas linhas.


Marcelo, obrigado pela oportunidade da entrevista. Vamos começar. Marcelo o que o fez gostar de guitarra? Quais suas principais influências?


Olá, de nada. É um prazer dividir um pouco da minha história e experiência. Comecei na guitarra cedo, aproximadamente aos treze anos. Obviamente, neste momento era apenas uma brincadeira e meu contato com o instrumento era totalmente descompromissado. O interesse surgiu, acredito eu, por que na época o Rock Brasil estava em alta. Bandas como Capital, Ira, Legião etc ... Faziam muito sucesso e era comum os adolescentes quererem tocar um instrumento e ter uma banda. Pouco antes disso havia acontecido o Rock in Rio I, que chamou a atenção da grande mídia para o Rock e o Metal colocando a gente de cara com o Maiden, AC/DC e tantas outras maravilhas que vieram para tocar neste festival. Acho que o momento era rico, o solo era fértil e eu, fatalmente, fui uma das sementes plantadas que acabaram por germinar. Quanto às influências, isso é muito abrangente... E muda de tempos em tempos. Vou citar as que influenciaram quase todos os guitarristas de rock da minha época como Vai, Satriani e Malmsteen. Depois disso, de maneira mais específica, comecei a curtir muito o som do Greg Howe, Kotzen , Michael Lee Firkins e Brett Garsed. Acho que eu poderia passar o dia citando guitarristas e músicos maravilhosos que se não me influenciaram diretamente ao menos me inspiraram mas se a pergunta é para uma dica do que ouvir podemos ir por outro caminho. Pra começar, evite ao máximo música vazia e sem expressão. Estraga o ouvido e o senso estético de qualquer um. Aos poucos você começa a não achar tão ruim e se vacilar começa a gostar. É como um processo de emburrecimento, mas no âmbito musical. Quer pesquisar uns sons bons e não tão conhecidos? Posso indicar alguns: Diego Figueiredo, Allen Hinds, Danielle Gottardo, Alex Hutchings e centenas de outros.


Pelo que consta em sua biografia em seu site, você iniciou os estudos das cordas aos 12 anos se tornando músico profissional aos 17. Qual era o ritmo de estudo para que este resultado fosse alcançado tão rapidamente?


Como eu disse, no início tudo era muito leve e sem cobrança. Com 15 anos de idade comecei a estabelecer um ritmo de estudo mais forte e dos 16 em diante eu tocava basicamente o tempo todo. Fiz a prova da ordem dos músicos prestes a completar 18 pois teria que me alistar naquele ano e a aeronáutica, exigia alguma profissão para que pudéssemos nos alistar nela. Pensei que se eu fosse um profissional da guitarra poderia me alistar lá e não ser convocado, pois não imaginava uma banda marcial com uma guitarra elétrica em sua formação. Não acredito que tenha sido por isso mas acabei sendo dispensado e a carteira da OMB (que aqui em Brasília era até relativamente difícil) desde então nunca me serviu pra nada. Rs...


Em 1996 você fundou o GTR, que hoje é uma referência nacional aos estudantes de guitarra não só no Brasil, mas na América Latina também, conte-nos um pouco mais do surgimento desta idéia e como foram os primeiros passos deste instituto? Você imaginou que o GTR um dia iria chegar a este patamar? Como é feita a administração atualmente?


Eu costumo sonhar alto, mas entre sonhar e ver esse sonho aos poucos se tornar uma realidade há sempre um grande espaço. Hoje o GTR é uma instituição sólida, com 15 anos de tradição. Tenho alguns funcionários que cuidam da rotina da escola e um braço direito que permite que eu mantenha minha vida artística acontecendo enquanto a escola funciona. Fora isso, de maneira geral, estou sempre envolvido, dando aulas e direcionando a administração e o marketing da escola. Fico ali meio que com aquele “olhar de girafa” vendo de tudo um pouco e pensando em como obter os melhores resultados.


Quantos alunos foram formados ao longo destes anos e quais nomes promissores você indicaria para ficarmos de olho?


Nossa, eu não saberia te precisar um número. São muitos. Quanto aos nomes promissores, muitos já estão se destacando na cena. Posso citar alguns, mas com certeza esquecerei de outros. Vamos lá: Bruno Albuquerque, Diogo Mafra, Alex Pires, Dimas Andrade, Rodrigo Karashima, Rodrigo Fernandes, Lucas Fagundes, Rodrigo Vegetal, Ian Bemolator... E muitos outros.


Marcelo Barbosa Com o Khallice.


Em 2003 você lançou junto com Michel Marciano (Bass), Pedro Assumpção (Drums), Renato Gomes (Keyboards), Alírio Netto (Vocals), o álbum de estréia do Khallice, The Journey?Do que você se lembra desta época?


Bom, o The Journey na verdade foi lançado antes disso. Acho que em 2003 ele foi relançado, dessa vez por uma gravadora, pois até então era um CD independente. A maioria das músicas foi composta por mim, ainda muito novo e aos poucos fechamos um repertório e resolvemos gravar. Nós não tínhamos muito dinheiro e a grana que usei para pagar a gravação foi uma pequena herança que recebi com o falecimento da minha querida avó. Ela havia sido a pessoa que me deu minha primeira guitarra também, portanto, não achei que ela se incomodaria, se eu gastasse o dinheiro com isso. O valor que recebi não era muito e acredito que serviu para pagar aproximadamente 40% da gravação. O resto eu banquei com aulas de guitarra. Demorou bastante tempo para o CD ficar pronto pois estávamos sem vocalista, foi um puta trampo. Mas no final tudo deu certo.


Como foi a recepção do álbum?


Bem melhor do que imaginávamos. Fizemos muitos shows, vários deles em festivais gigantes pra mais de 20 mil pessoas. Assinamos com uma gravadora nacional e depois com a estadunidense Magna Carta. Muitos frutos foram colhidos desta empreitada.


Marcelo, o Khallice foi apelidado pelos fãs como o “Dream Theater brasileiro”, sendo considerada até como a melhor banda de prog metal do mundo, o que você acha desta comparação? E quais suas impressões sobre o Dream Theater?


A comparação era inevitável. O estilo é o mesmo e o DT é a maior referência no estilo. Adoro DT. É sem dúvida uma das minhas bandas favoritas, mas gosto mais dos CDs mais antigos, até o Scenes From A Memory. Tem muita coisa boa depois dele, mas acho que até então havia uma aura que aos poucos se perdeu. Ou fui eu quem mudei.... sei lá...


Em 2008 o Khallice retornou com o EP, Inside Your Head, o que ocasionou a demora para este segundo lançamento da banda? Existem planos futuros para a mesma?


Todos na banda são músicos profissionais e vivem de música. Cada um tem os seus projetos e a sua rotina de trabalho e às vezes fica difícil conciliar. Nesse interim eu entrei no Almah, gravei o Fragile Equality, excursionei pelo Brasil com banda, fui pai... rs Muita coisa aconteceu. Lançamos o EP no Rio de Janeiro, na abertura do show do Dream Theater, pois fomos escolhidos por eles via concurso para participar deste evento. Sem dúvida gravaremos material novo com o Khallice. Assim que nossas agendas se encontrarem novamente. Rs


Marcelo Em Ação Nos Tempos de Khallice.


Como foi a participação na coletânea Guitarras do Cerrado em 2003 e nas recentes coletâneas virtuais, Heróis da Guitarra?


É sempre bom estar envolvido neste tipo de iniciativa. Além do prazer de tocar ao lado de excelentes músicos é uma oportunidade de experimentar algo diferente, novo.


Qual você acha a importância deste tipo de trabalho na música nacional?


Acho que qualquer mobilização que tenha como objetivo fomentar a cena do rock, da música instrumental, da guitarra em sim, extremamente válidos. Esses estiulos não têm abertura na grande mídia, portanto, dependemos de iniciativas como essas pra divulgar e propagar esses trabalhos.



Marcelo Com Seus Companheiros do Almah.


Atualmente você faz parte do line-up da banda Almah. Como tem sido esta experiência e como foi o convite para sua entrada na banda?


A experiência com o Almah tem sido maravilhosa. Bom, quanto ao convite, eu já conhecia a galera do Angra de longas datas e, inicialmente, o Edu Ardanuy estava tocando na banda. Quando ele decidiu não continuar me indicou. Como já conhecia o Edu e o Felipe acho que minha entrada acabou sendo natural.


Como foram as gravações de Fragile Equality e como estão os processos para o lançamento do terceiro álbum do Almah?


O Fragile foi o primeiro registro com essa formação e rendeu bons resultados. Acabamos de receber a master do Motion e estamos muito empolgados com o resultado final. O lançamento mundial está previsto para setembro e estamos muito ansiosos pelo lançamento. Está tudo praticamente pronto esperando apenas as datas previstas pelas gravadoras.


Marcelo Com o Angra.


Ainda no meio do Rock/Metal, recentemente você foi convidado para tocar em alguns shows do Angra. Como tem sido esta experiência e a receptividade dos fãs?


O Kiko é um amigo e parceiro de longas datas. O primeiro workshop organizado pelo GTR foi com ele e o mesmo me contactou há algum tempo perguntando se eu não poderia substitui-lo em alguns shows. Pra mim é uma honra receber tal convite tanto pelo que ele representa pra guitarra mundial quanto pelo que o Angra representa. A experiência tem sido gratificante e os fãs têm me recebido com muito respeito e carinho. Não há nada o que reclamar, tudo lindo.


Fugindo um pouco do som pesado, vamos falar rapidamente sobre sua outra banda, a Zero 10. Qual o tipo de som que você executa nesta banda?


A Zero10 é uma banda que acaba de completar uma década. Tocamos Pop/Rock de qualidade desde Tears for Fears até Nickelback passando por muitos outros. É pura diversão. Tocamos todas as semanas sempre com um bom cachê e em casas comumente lotadas.


Para uma grande parcela da população, o fã e/ou o músico de Rock/Metal é um ser bitolado que não consegue ter a percepção de outras sonoridades. A banda Zero 10 é uma pequena amostra de como isso não é real, óbvio que temos fãs xiitas em todos os estilos de música, não só no Metal. O quão é importante para você como pessoa e músico explorar outras sonoridades e estilos?


É importante saber que estilo musical não é religião. Adoro Pantera e também Simply Red. Tudo que é feito com verdade, qualidade e bom gosto me apetece. O problema é justamente esse separatismo que, em minha opinião, não deveria haver. Eu sou uma pessoa que artisticamente busca o novo sempre. Ouvir outros estilos te dá uma nova percepção de sons, cadencias harmônicas, fraseados e melodias. O cara pode ser um puta músico, mas se em 2011, gravar o CD que o McAlpine gravou em 1995, para mim, tem valor técnico e talvez comercial, mas não artístico. A música é uma combinação infinita de sons e climas mesmo quando limitadas por um estilo musical específico. Vale à pena tentar sair do óbvio.


Marcelo, como você vê a cena que possuímos hoje no país? O que na sua opinião falta para termos uma cena forte e estável?


Se você se refere à cena metal ela é fraca sim. Acho que em parte fruto da desunião mencionada na outra pergunta. A cena é pequena e muito dividida. Isso acaba segmentando demais o mercado. Acho que falta união entre as bandas e os fãs. Qualquer movimento musical ou cultural forte, que deu certo e se manteve, surgiu da união de pessoas com o mesmo fim. É isso que falta.

Marcelo Barbosa, Live.


Quais os percalços que um músico enfrenta neste nosso país atualmente?


Os mesmos que todos os outros cidadãos, só que um pouco pior. Em um país onde a maioria não tem as suas necessidades básicas supridas a cultura fica em milésimo lugar né? Antes vem o comer, viver, vestir etc, etc, etc. O buraco é bem mais embaixo. Esse assunto dá pano pra manga. Poderíamos fazer uma entrevista inteira só sobre ele. De qualquer forma, acredito que quem trabalha com dedicação e seriedade em qualquer segmento se destaca e se estabelece. Não posso reclamar em nada da minha vida. Vivo muito bem, e o que tenho vem da música. Isso por si já é uma benção.


Com anos de experiência e estrada, existe algum artista ou banda que chame sua atenção nos dias de hoje?


Sim. Vez ou outra aparece. Todos que citei na primeira pergunta por exemplo. Mas minha atenção pode ser chamada por diversos motivos. Pelo nível de produção. Pelo grau de simplicidade e ao mesmo tempo autenticidade de um trabalho. Enfim, o dia que acontecer de nada me chamar atenção na música eu perco o tesão de tocar. Estou sempre empolgado e adoro o novo.


Marcelo chegamos ao fim da entrevista, espero que não tenha sido uma tarefa maçante responder a nossas perguntas. Muito obrigado mais uma vez. Fica aqui o espaço para você enviar um recado aos fãs:


Imagina, é sempre um prazer. Agradeço o carinho de todos. Espero que em breve nos encontremos pessoalmente com o Almah ou outro trabalho. E lembrem-se: "Nós somos aquilo que fazemos repetidas vezes, repetidamente. A excelência portanto não é um feito, mas um hábito" O que você anda fazendo na sua vida?


Abraços!

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